InfoAmazônia
Aldem Bourscheit
04 de novembro de 2021
Lideranças defendem que parte dos recursos seja destinado à garantia e manutenção dos seus territórios. Definição de como vai funcionar os mercados de carbono ocorrerá até o fim da COP26.
Indígenas esperam que a 26ª Conferência das Nações Unidas sobre as Mudanças Climáticas defina como o seu papel na preservação da Amazônia será beneficiado por mecanismos como o mercado de carbono. As regras serão firmadas no encontro que segue até o dia 12, em Glasgow (Escócia). Podem ser estabelecidos mercados privado e voluntário, além de meios para a troca de créditos para emissões de poluentes entre países que integram o Acordo de Paris, de 2015.
O Brasil assumiu novos compromissos junto ao tratado. Diante da janela de oportunidade, lideranças presentes na COP26 fizeram um apelo para que parte dos recursos que financiarão o combate à crise climática seja aplicado na garantia de seus direitos. “Sem povos e territórios indígenas não há enfrentamento da crise do clima. Condições financeiras derivadas da conferência devem ser usadas para demarcar territórios, fortalecer sua proteção e gestão. Os países precisam contemplar isso em seus debates na COP26”, ressaltou Sônia Guajajara, coordenadora-executiva da Articulação dos Povos Indígenas do Brasil (APIB). O Manifesto da Aliança Global de Comunidades Territoriais denunciou que povos indígenas e comunidades locais não participaram dos arranjos que destinaram US$ 19,2 bilhões à proteção das florestal esta semana, no Forest Deal.
Os indígenas são chaves na preservação da Amazônia. Segundo o MapBiomas, apenas 1,6% do desmatamento entre 1985 e 2020 ocorreu em terras indígenas (TIs). No país, existem 723 TIs que representam 14% (1.174.273 km²) do território nacional. Cerca de 98% delas estão na Amazônia Legal. Dados oficiais mostram que a Amazônia perdeu 457 mil km² desde 1988, quando iniciou o mapeamento do Instituto Nacional de Pesquisas Espaciais (INPE). A área é semelhante a duas vezes o território do Reino Unido.
Os indígenas são chaves na preservação da Amazônia. Segundo o MapBiomas, apenas 1,6% do desmatamento entre 1985 e 2020 ocorreu em terras indígenas (TIs). No país, existem 723 TIs que representam 14% (1.174.273 km²) do território nacional. Cerca de 98% delas estão na Amazônia Legal. Dados oficiais mostram que a Amazônia perdeu 457 mil km² desde 1988, quando iniciou o mapeamento do Instituto Nacional de Pesquisas Espaciais (INPE). A área é semelhante a duas vezes o território do Reino Unido.
O mercado mundial de créditos de carbono surgiu após a assinatura do Protocolo de Quioto, em 1997. Ele definiu as regras iniciais para países industrializados compensarem suas emissões de gases de efeito estufa comprando créditos gerados por projetos que cortassem e/ou absorvessem poluentes em nações em desenvolvimento. Mas, passadas mais de duas décadas, o mecanismo ficou desatualizado e deve ser autalizado às metas do Acordo de Paris, firmado para manter o aumento da temperatura média global abaixo de 2ºC.
No Brasil, os indígenas vivem um momento particularmente hostil. Na contramão dos debates para deter a crise climática, o governo Jair Bolsonaro congelou demarcações de territórios e enfraqueceu órgãos de fiscalização, como o Ibama. Também apoia projetos legislativos como o PL 490, que tramita no Congresso para acabar com as demarcações e abrir TIs à agropecuária, mineração e geração de energia. Isso ampliaria ameaças à sobrevivência de povos originários e o desmatamento e as emissões de poluentes climáticos pelo Brasil.
Exemplos nacionais
A gerente para Políticas Públicas e Relações Governamentais na ONG TNC Brasil, Karen Oliveira, explica que o mercado de carbono é um pano de fundo para que os países cumpram as promessas feitas no Acordo de Paris. Para isso, o “livro de regras” que for aprovado na COP26 deve detalhar temas como fontes orçamentárias para as ações de combate, adaptação e limitação do aquecimento global. “Os debates envolvem os mercados regulados, mais voltados a ações de governos e possibilitando a troca de créditos entre países; e os não regulados, dependendo de oferta e demanda entre atores privados. Há expectativa de ampliarmos o número e a escala de projetos para a redução de emissões de gases de efeito estufa com estes novos mercados”, descreveu.
No Brasil, existem iniciativas-piloto que podem inspirar a regulamentação deste tipo de mercado. No Pará, um exemplo é o projeto da TNC Brasil em São Félix do Xingu, que pode aumentar a renda de agricultores com a produção agroflorestal de cacau e pela venda de créditos de carbono gerados pela restauração de 18 mil hectares. O Acre foi pioneiro no país na venda de créditos de carbono, graças a uma legislação aprovada em 2010. Em Rondônia, o Reca, cooperativa agroflorestal formada por 300 famílias, recebe dividendos pela manutenção da floresta do projeto Carbono, liderado pela Natura e Instituto de Conservação e Desenvolvimento Sustentável da Amazônia (Idesam). “Iniciativas como essas são pilotos. Precisamos de uma nova regulação para avançarmos na redução global da poluição climática”, ressaltou Oliveira.
As regras para o mercado de carbono que forem definidas na COP26 deverão ser incorporadas pelas nações que ratificaram o Acordo de Paris, como o Brasil. No país, um projeto de lei do deputado federal Marcelo Ramos (PL-AM) quer regular a compra e a venda desses créditos. A relatora do texto na Comissão de Meio Ambiente da Câmara é a deputada federal Carla Zambelli (PSL-SP).
Boas regras nacionais e internacionais são fundamentais para que ferramentas como o mercado de carbono realmente cortem as emissões de poluentes climáticos. Entidades civis esperam que os meios para financiar o combate à crise do clima não se tornem “licenças para poluir” ou deixem sem proteção as populações indígenas e rurais. “O mercado de carbono transfere responsabilidades e desvia recursos de soluções reais à crise do clima. O Brasil não deve aceitar o mecanismo como uma compensação para a proteção de florestas por países que deveriam abandonar a queima de combustíveis fósseis”, destacou Maureen Santos, da ONG FASE (Federação de Órgãos para Assistência Social e Educacional) e professora da PUC-Rio.
Outro receio é o de que os mercados sejam comandados por organismos financeiros. Um manifesto do Grupo Carta de Belém endereçado à COP26 alerta que os direitos de populações rurais e tradicionais estão ameaçados se as decisões sobre o enfrentamento da crise climática forem concentradas em bancos, empresas e setor financeiro a partir das decisões da COP26. “Poluidores com poder de compra de créditos (de carbono) podem continuar com suas práticas predatórias em detrimento dos territórios e populações menos industrializados, o que representa uma responsabilidade climática completamente desigual. Esse intercâmbio financeiro relega aos países do Sul global o papel de sumidouros de carbono”, ressalta a declaração.
Texto original disponível em: https://infoamazonia.org/2021/11/04/indigenas-mercado-carbono-preservacao-amazonia/