Amazônia sufocada

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Revista Piauí
Amanda Gorziza, Cristina Amorim e Renata Buono
01 de novembro de 2021

 

A 26ª Conferência do Clima das Nações Unidas, em Glasgow, no Reino Unido, começou neste domingo (31). O Brasil chega à reunião fazendo muito pouco para combater o desmatamento, principal fonte de emissão de gases do efeito estufa no país. Em 24 anos, a área destruída somente nas florestas públicas da Amazônia é maior que o Uruguai, segundo dados do Instituto de Pesquisa Ambiental da Amazônia (Ipam). As terras públicas da Amazônia são divididas em destinadas – unidades de conservação e terras indígenas, ou seja, áreas protegidas – e as chamadas não destinadas, áreas sem desígnio pelo poder público e que em nenhum momento integraram o patrimônio particular, mesmo que estejam irregularmente sob sua posse. Essas áreas não destinadas, menos protegidas, são justamente as mais visadas: é nelas que ocorrem 87% dos desmatamentos de terras públicas no bioma. As áreas não destinadas incluem florestas mapeadas por um cadastro nacional do Serviço Florestal Brasileiro e as chamadas “outras terras não destinadas”, que não foram mapeadas. O =igualdades desta semana faz um raio X do desmatamento na Amazônia.

Dos 276,5 milhões de hectares de florestas públicas existentes na Amazônia, 21 milhões (8%) foram destruídos entre 1997 e 2020. A área desmatada em 24 anos é maior que o território do Uruguai, que tem 17,5 milhões de hectares. As florestas que cobrem as terras públicas estão sob responsabilidade da União e dos estados.

Desses 21 milhões de hectares de florestas públicas desmatadas, 87% ocorreram em áreas menos protegidas. As terras públicas não destinadas cobrem 29% da área total de terras públicas da Amazônia.

A pecuária ocupa 75% das áreas desmatadas das florestas públicas não destinadas. Entre 2006 e 2010, 596 mil hectares (73%) das florestas não destinadas eram pasto, já entre 2016 e 2020, essa área cresceu para 861 mil hectares (78%). Ou seja, mesmo após dez anos, a área desmatada aumentou cinco pontos percentuais. Segundo o Ipam, isso mostra que houve investimento econômico para permanência e conversão de novas áreas para a pecuária.

Cerca de 16 milhões de hectares de florestas públicas não destinadas são declarados como propriedade privada, pois estão registrados no Cadastro Nacional Rural (CAR). Isso equivale a 28% da área analisada. Segundo o estudo do Ipam, a existência de CAR sobrepostos a terras públicas é um indício forte de grilagem, que é o apossamento de terras com documentos falsos. Esse instrumento é bastante usado para viabilizar a utilização de terras públicas, entretanto o CAR serve para regularização ambiental e não fundiária.

Entre 1997 e 2020, o desmatamento de terras públicas da Amazônia emitiu 10,2 bilhões de toneladas de CO2. Isso corresponde a cinco anos de emissões de gases do efeito estufa no Brasil, que atingiram 2,16 bilhões de toneladas em 2020.

No ano em que a pandemia da Covid-19 fez o mundo parar, a emissão de gases diminuiu 6,7%. Mas o Brasil foi na contramão e aumentou 9,5% das emissões em relação ao ano anterior. O nível de emissões de CO2 em 2020 foi o maior desde 2006.

 

O principal fator para explicar o aumento da emissão de gases do efeito estufa, segundo o SEEG, é o desmatamento, em especial na Amazônia e no Cerrado. Em 2020, a mudança no uso da terra foi responsável por 46% das emissões de CO2 no país, seguida pela agropecuária, 27%, energia, 18%, processos industriais, 5%, e resíduos, 4%.

Fontes: Ipam, SEEG, Banco Mundial, Global Carbon Project

 

Texto original disponível em: https://piaui.folha.uol.com.br/amazonia-sufocada/