Projetos a favor do garimpo avançam nos estados da Amazônia

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O Globo
Eduardo Gonçalves e Adriana Mendes
15 de janeiro de 2022
Amazônia brasileira

Garimpeiros contam com apoio da política local, que critica operações como as do Ibama e da PF na terra ianomâmi e no Rio Madeira

BRASÍLIA — Em 8 de dezembro de 2021, o presidente da Assembleia Legislativa de Rondônia, Alex Redano (Republicanos), abriu os trabalhos dizendo que era preciso “estender o tapete vermelho” aos garimpeiros que compareceram em peso à audiência convocada para, nas palavras dele, “regular o mercado mineral”.
— O Poder Legislativo apoia a garimpagem — anunciou.
Na mesma época, em Roraima e Amazonas, as sessões legislativas também foram dominadas por discursos pró-garimpo e críticas a operações feitas pela Polícia Federal e pelo Ibama contra o crime ambiental nas terras ianomâmis e no Rio Madeira.
O discurso se converteu em ação. O governador de Rondônia, Marcos Rocha (PSL), sancionou na sexta-feira uma lei que proíbe a destruição de equipamentos em fiscalizações ambientais, impedindo órgãos estaduais de queimarem balsas e dragas de garimpo ilegal.
A Assembleia de Mato Grosso aprovou na semana passada um projeto que libera a mineração em áreas de reserva legal, desde que haja compensação ambiental. Essas áreas são destinadas à preservação em propriedades rurais e não poderiam ter o uso mudado pela legislação estadual, para o Ministério Público Federal e especialistas ambientais.
— O projeto pode fomentar o aumento dessa prática (garimpo) e resultar em novos desmatamentos — diz Ana Paula Valdiones, do Observatório Socioambiental.
Caso seja sancionado pelo governador Mauro Mendes (DEM), o projeto pode ser contestado no Supremo Tribunal Federal, como aconteceu em Roraima.
No início de 2021, a Assembleia de Roraima aprovou a liberação do garimpo de todos os tipos de minérios sem a realização de estudos prévios e com a utilização do mercúrio.
— É um reconhecimento do trabalho que os garimpeiros fazem por Roraima — declarou na época o presidente da Assembleia, Jalser Renier (SD).
Após a lei ser suspensa por liminar em fevereiro, o plenário do STF a invalidou por considerar que ela usurpava a prerrogativa da União de “legislar sobre jazidas, minas, outros recursos minerais e metalurgias”.
Uma jurisprudência do Supremo determina que os estados podem restringir ou especificar mais as regras gerais da União, e não o oposto, avalia o advogado do Instituto Socioambiental (ISA) Luiz Henrique Pecora.
Na linha contrária, no entanto, há um movimento de entidades de garimpeiros, com apoio da política local, para “estadualizar” os projetos relacionados à extração mineral.
A sessão legislativa de 8 de dezembro em Rondônia foi uma prova disso. Após o plenário entoar o hino estadual, o diretor da Associação Nacional dos Mineradores de Ouro do Tapajós, José Altino Machado, proclamou as Assembleias Legislativas da Amazônia Legal a se unirem na “luta contra o regime federativo desse país” em relação ao garimpo.
— Compete à União organizar a atividade garimpeira. Ela não fez o trabalho dela e é por isso que estamos com esse problema. Nossa proposta é que devolvam o poder de organização aos estados — afirmou Altino, considerado hoje o maior líder garimpeiro da Amazônia (procurado, ele não foi localizado pela reportagem para comentar os projetos).

Apoio multipartidário

Mais sujeitas à pressão das cooperativas garimepeiras do que o Congresso Nacional, os legislativos estaduais têm uma tradição na defesa da atividade, que, apesar de ser histórica na região amazônica, causa danos irreversíveis ao meio ambiente. O pleito envolve a maioria dos parlamentares, de bolsonaristas a lulistas.
Um dos principais defensores, por exemplo, é o deputado estadual Sinésio Campos, presidente do PT no Amazonas. Presidente da Comissão de Mineração e Energia da Assembleia de seu estado, Sinésio defende que o garimpo, ou “extrativismo mineral familiar”, como chama, deve ser tratado como “política mineral”, e não como “caso de polícia”.
— Defendo a mineração, não o ato irresponsável. Temos de regulamentar de uma forma ambientalmente correta — disse o deputado, também favorável à exploração em terras indígenas. — Como no Canadá e Austrália: fazer pelas populações tradicionais.

Texto original disponível em: https://oglobo.globo.com/um-so-planeta/projetos-favor-do-garimpo-avancam-nos-estados-da-amazonia-25355609