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Gus Greenstein | Translated by Mariana Almeida
Mongabay
17 de setembro de 2018
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- Instituições Financeiras de Desenvolvimento Internacional investiram pesado em projetos de infraestrutura de grande porte que causaram desmatamento no Corredor Andes-Amazônia, em especial no Equador, Peru e Bolívia, entre os anos 2000 e 2015, segundo uma pesquisa recente publicada pelo Centro de Políticas de Desenvolvimento Global da Boston University.
- Com o uso de dados de satélite, a pesquisa analisou 84 grandes projetos de grande infraestrutura e determinaram que a área ao redor desses projetos sofreu perda de cobertura vegetal em quantidade quatro vezes maior que a média, se comparada com áreas onde não existem tais projetos nos países supracitados. Essa é uma perda de sequestro de carbono equivalente à emissão anual de CO2 da Colômbia, Chile e Equador juntos.
- Os projetos de infraestrutura representam, hoje, 60% de toda a emissão global de gases do efeito estufa, mas ainda assim as Instituições Financeiras de Desenvolvimento Internacional querem aumentar os empréstimos de milhões para trilhões a fim de atender a demanda global. Isso colocaria em perigo as metas nacionais do Acordo do Clima de Paris (que, em países como o Brasil, estão ligadas à prevenção do desmatamento), e poderia contribuir para níveis catastróficos de emissão de carbono no mundo.
- O estudo não é apenas de escopo acadêmico: mais de 70 bilhões de dólares em projetos de infraestrutura, apoiados por bancos de desenvolvimento e pelo setor privado, estão planejados para regiões na bacia do Amazonas dentre agora e o ano de 2020. Os pesquisadores esperam que as lições aprendidas com projetos desse tipo no passado, destacadas em sua pesquisa, possam eliminar a imprudência de futuros projetos para ajudar a diminuir o desmatamento.
[/vc_column_text][/vc_column][/vc_row][vc_row][vc_column][vc_column_text]Instituições Financeiras de Desenvolvimento Internacional possibilitaram o desmatamento em larga escala na Amazônia, e não há nenhum sinal de que essa tendência diminuirá, segundo uma pesquisa recente publicada pelo Centro de Políticas de Desenvolvimento Global da Boston University. Ao invés disso, afirmam os autores Rebecca Ray, Kevin Gallagher e Cynthia Sanborn, “é provável que (os riscos e custos ambientais) aumentem”.
Projetos financiados por Instituições Financeiras de Desenvolvimento Internacional provocaram desmatamento expressivo no Equador, Peru e Bolívia entre os anos de 2000 e 2015, segundo o estudo. Com o uso de dados de satélite, os autores analisaram 84 projetos e determinaram que a área ao redor desses projetos “passaram por perda de cobertura vegetal em proporção quase quatro vezes a mais do que a média, se comparado a áreas desses países que não possuem tais projetos”. É uma perda para a absorção de carbono equivalente à emissão anual da Colômbia, Chile e Equador juntos.
Atualmente, os países da Amazônia Andina “passam por um surto de programas de infraestrutura”, segundo os autores do relatório, com projetos financiados por Instituições Financeiras de Desenvolvimento Internacional avançando, cada vez mais, para a bacia do rio Amazonas. Quase metade dos 60 projetos financiados no Equador, Peru e Bolívia, entre 2000 e 2015, estão localizados na bacia do Amazonas. E outros 45 dos 57 projetos financiados, finalizados, desde 2015, ou que estão em fase de planejamento, estão, ou serão localizados na bacia do rio.
As análises dão motivos para preocupação: projetos de infraestrutura, hoje, são responsáveis por 60% das emissões globais de gases do efeito estufa, e ainda ssim, algumas Instituições Financeiras de Desenvolvimento Internacional querem aumentar seus empréstimos e passar de “bilhões para trilhões” com o objetivo de atender a grande demanda global por infraestrutura – a previsão é que se ultrapasse os 97 trilhões de dólares até 2040. Isso representa uma péssima notícia para os países da América do Sul que tentam alcançar seus objetivos firmados no Acordo do Clima de Paris (que, em países como o Brasil, estão ligados à prevenção ao desmatamento), e para a comunidade internacional, que tenta controlar emissões catastróficas de gases do efeito estufa.
Visão geral do projeto de infraestrutura na Amazônia
Instituições Financeiras de Desenvolvimento Internacional financiaram cerca de 100 projetos de infraestrutura em países abrangidos pela bacia do rio Amazonas entre os anos de 2000 e 2015. A maioria deles (84) foi implementada na Bolívia, Colômbia, Equador e Peru. Por isso, Rebecca e seus colegas focaram seus estudos nessa região.
As Instituições Financeiras de Desenvolvimento Internacional estudadas pela Boston University incluíram o Banco Mundial, o Banco Interamericano de Desenvolvimento, o Banco de Desenvolvimento da America Latina, o Banco Nacional de Desenvolvimento Econômico e Social (BNDES), o Banco de Desenvolvimento da China, e o Banco de Exportação e Importação da China. Algumas outras Instituições Financeiras de Desenvolvimento Internacional contribuíram para o financiamento de projetos de infraestrutura na Amazônia, afirma Rebecca, “mas em proporção bem menor e em especial em conjunto de Instituições Financeiras de Desenvolvimento Internacional que têm um histórico na região”.
Durante os 15 anos de estudo, Instituições Financeiras de Desenvolvimento Internacional apoiaram, principalmente, a construção e melhoria de estradas, e de novas barragens hidroelétricas, consideradas como neutras na emissão de carbono, mas que estão cada vez mais sendo consideradas como uma grande fonte de emissão de gases do efeito estufa, independentemente do desmatamento resultante da construção da barragem. Outros projetos incluem portos, usinas de energia renovável e usinas de energia termoelétrica.
Muitas das construções estudadas pela pesquisa aconteceram nas fronteiras da Amazônia equatoriana, da costa pacífica do Peru e no sul da Bolívia. Em particular, dos projetos que Instituições Financeiras de Desenvolvimento Internacional financiaram no Brasil durante o período considerado, nenhum foi implementado na bacia do Amazonas. Foram desconsiderados os projetos brasileiros financiados pelo país, pelo BNDES, como a extremamente criticada Barragem de Belo Monte. O motivo para tal, de acordo com Ray, é que a pesquisa teve como foco apenas os financiamentos internacionais que visam à melhoria das relações entre comunidades locais, governos nacionais e credores externos.
Desempenho ambiental abaixo do esperado entre as Instituições Financeiras de Desenvolvimento Internacional
A maior parte do desmatamento, de acordo com os autores do estudo, pode ser atribuída aos “impactos diretos e indiretos dos projetos, como por exemplo, a mineração ilegal que se precede à abertura oficial da floresta”.
A Estrada Interoceânica do sul do Peru foi um dos projetos que causou mais danos. Em 2015, mais de 15% das áreas cobertas pela floresta em um raio de 10 a 403 quilômetros da estrada foram desmatadas. A estrada foi financiada pelo Banco de Desenvolvimento da América Latina.
A Estrada Riberalta-Guayamerín, no norte da Bolívia, foi outro projeto que causou grande impacto. Quase metade da cobertura vegetal no raio de um quilômetro de distância da estrada foi perdida em 2015. No mesmo período, áreas na Bolívia, distante de projetos de infraestrutura financiados pelas Instituições Financeiras de Desenvolvimento Internacional, sofreram uma perda de cobertura vegetal de 7%. A Estrada Riberalta-Guayamerín também foi financiada pelo Banco de Desenvolvimento da América Latina.
Essas descobertas não são surpresa para Scott Edwards, Diretor-executivo do Fundo Estratégico de Conservação, uma ONG ambiental internacional, com sede em Washington D.C. “Em 20 anos de experiência no Fundo, trabalhando com questões de infraestrutura de desenvolvimento, chegamos a conclusões muito parecidas”.
No entanto, Scott acredita que o desempenho ambiental de algumas Instituições Financeiras de Desenvolvimento Internacional melhorou bastante nas últimas décadas. “Acredito que houve um esforço combinado entre o Banco Mundial e o Banco Interamericano de Desenvolvimento para reponder à pressão do público por mais precauções”, afirma. “Não acredito que o mesmo nível de desempenho possa se aplicar a outros bancos de desenvolvimento”.
O estudo da Boston University discorda com essa visão mais otimista, e acredita que “não há um único modelo ou banco que agiu melhor”, afirma Kevin Gallagher. O que parecia importar, em vez disso, é se os projetos eram ou não “conduzidos de acordo com as regulamentações (tanto nos governos nacionais quanto das Instituições Financeiras de Desenvolvimento Internacional), que demandam uma consulta prévia às comunidades indígenas afetadas”.
A descoberta com relação à consulta aos indígenas foi especialmente notável na Bolívia. No país, áreas próximas a projetos de infraestrutura financiados por Instituições Financeiras de Desenvolvimento Internacional que não demandavam uma consulta prévia sofreram uma queda de 36,5% na cobertura vegetal. Com os projetos que realizaram a consulta, a queda foi de 21,1%.
Essa descoberta é relevante no momento em que as Instituições Financeiras de Desenvolvimento Internacional começam a dirigir a maioria dos financiamentos para projetos na bacia brasileira do Amazonas, onde o governo nacional já vem há tempos sendo acusado de não cumprir sua obrigação legal com relação à Convenção 169 da Organização Internacional do Trabalho, que exige a consulta aos indígenas antes que grandes projetos de infraestrutura sejam realizados – projetos como as megabarragens e ferrovias. O Brasil e outros países da região amazônica são todos signatários desse acordo internacional.
Na Colômbia, áreas próximas a projetos financiados por Instituições Financeiras de Desenvolvimento Internacional enfrentaram um ritmo similar de desmatamento, enquanto áreas que não receberam tais projetos apresentaram desmatamento de cerca de 3%. Todos os projetos na Colômbia cumpriram os processos de consulta prévia aos povos indígenas.
Instituições Financeiras de Desenvolvimento Internacional não têm autorregulação suficiente
Kevin Gallagher ressalta as dificuldades em se obter uma medição precisa dos impactos sociais e ambientais causados pelas atividades dos projetos de infraestrutura na Amazônia. “As Instituições Financeiras de Desenvolvimento Internacional não possuem sitemas de mensuração e monitoramento que permitam com que ela, especialistas de fora, e a sociedade civil avaliem, monitorem e responsabilizem os projetos por suas operações”, afirma. “Instituições Financeiras de Desenvolvimento Internacional fazem parte, agora, dos Objetivos de Desenvolvimento Sustentável da Organização das Nações Unidas e precisam alinhas suas políticas a eles, além de medir os avanços”.
Mas o progresso com relação a essa responsabilidade é questionável. “Enquanto credores de Instituições Financeiras de Desenvolvimento Internacional mudaram ao longo do tempo, e padrões melhoraram, ao menos no papel, muito pouco mudou na realidade”, afirma Kevin Koenig, Diretor no Equador do Programa Amazon Watch, ONG ambiental. “Presenciamos, claramente, o mesmo tipo de esquemas de desenvolvimento que caracterizaram a região há décadas. Eles estão transformando a Amazônia rapidamente – de região de sequestro de carbono para fonte de carbono no momento em que o clima e o planeta menos podem de se dar ao luxo para tanto”.
A relação das Instituições Financeiras de Desenvolvimento Internacional com os esforços globais para combater as mudanças climáticas é crítica, ressaltam especialistas. O estudo da Boston University não é o único a destacar o crescimento de projetos de infraestrutura financiados pelas Instituições Financeiras de Desenvolvimento Internacional com alta emissão de carbono. O think-tank de mudanças climáticas E3G descobriu que, assim como em 2017, investimentos em combustíveis fósseis feitos por bancos de desenvolvimento multilaterais, tais como o Grupo do Banco Mundial e o Banco Europeu para a Reconstrução e o Desenvolvimento ainda ultrapassam as atividades financeiras relativas ao clima dessas instituições. Um relatório recente do Banco Mundial revelou que, de todos os projetos de infraestrutura em que tanto as financeiras privadas como as Instituições Financeiras de Desenvolvimento Internacional multilaterais estiveram envolvidas, entre 2002 e 2017, essas instituições gastaram 75% a mais em projetos convencionais do que em projetos com baixa emissão de carbono.
Das cinco Instituições Financeiras de Desenvolvimento Internacional estudadas pela pesquisa da Boston University, somente o Banco Interamericano de Desenvolvimento respondeu o pedido de comentário feito pela Mongabay.
Janine Ferretti, chefe da unidade de Defesa Ambiental e Social do Banco Interamericano de Desenvolvimento, destaca que o Banco está “ciente das descobertas apresentadas pelo relatório” e que se encontrou com os autores neste ano para discutir “algumas abordagens pioneiras para a gestão de risco ambiental e social”. Ela afirmou que o Banco “acolhe os esforços feitos para estudar as relações entre o financiamento do projeto e a mudança no uso da terra”, e disse que o estudo é “uma contribuição importante”.
Entretanto, Janine também afirmou que “é importante reconhecer os desafios metodológicos existentes para se fazer esse tipo de pesquisa, alegando que há a necessidade de se estabelecer, de forma mais clara, o período em que ocorreram o investimento e o desmatamento entre os anos 2000 e 2015”.
Ela se refere, em especial, à Rodovia Montero-Yapacaní, na Bolívia, ao aumento da rodovia que a o Banco Interamericano de Desenvolvimento está financiando atualmente, e um dos estudos de caso que aparecem no relatório. Janine destaca que a estrada atual “é de cinco décadas atrás, uma estrada de duas faixas apenas” e que o desmatamento na área “ocorreu ao longo de várias décadas, antes da chegada do financiamento do Banco, com o objetivo de limpar a terra para a produção de cana de açúcar e outros produtos agrícolas”.
O estudo da Boston University apresenta uma relação qualitativa do financiamento feito pelo Banco Interamericano de Desenvolvimento com o desmatamento na área – além de relatar o conflito social relacionado aos trabalhadores que não receberam pagamento para acompanhar o projeto – mas não relaciona esse desmatamento ao financiamento feito pelas Instituições Financeiras de Desenvolvimento Internacional.
Janine acrescenta que a proteção ao meio ambiente e à vida dos stakeholders das Instituições Financeiras de Desenvolvimento Internacional é o princípio central das políticas de proteção do Banco Interamericano de Desenvolvimento. “Estamos prontos para aplicar a hierarquia de mitigação e um leque de outras estratégias para identificar e resolver os desafios que possam surgir durante os projetos e programas do Banco”, afirma.
A crescente influência chinesa
Mais de 70 bilhões de dólares em projetos de infraestrutura, concedidos tanto por bancos de desenvolvimento e pelo setor privado, estão atualmente destinados à região da bacia do Amazonas, de agora até 2020, segundo o estudo da Boston University.
Isso inclui a rodovia Rurrenbaque-Riberalta na Bolívia, financiada pelo Banco de Exportação e Importação da China, a barragem San Gabán III no Perú (Banco Chinês de Desenvolvimento), o projeto de revitalização da barragem Simon Bolivar na Venezuela (Banco de Desenvolvimento da América Latina), e a barragem Hidroituago, na Colômbia, financiado pelo Banco Interamericano de Desenvolvimento, fundo chinês associado à Empresa de Investimentos Interamericana, e bancos privados.
Um aumento de recursos está prestes a surgir, afirma Kevin Gallagher. “A bacia do Amazonas é fonte de combustível, madeira de lei, soja, gado, e canais aquáticos de energia. Os países querem explorar esses recursos, querem fornecer infraestrutura para facilitar o acesso desses bens ao mercado”, relata.
Os bancos chineses – o Banco de Desenvolvimento da China e o Banco de Exportação e Importação da China – financiaram, ou irão financiar, quase um terço dos projetos de infraestrutura que as Instituições Financeiras de Desenvolvimento Internacional têm planejados, hoje, para a bacia do Amazonas.
A predominância da China como financiadora de infraestrutura na América Latina está diretamente ligada a sua política de aumentar rapidamente a sua influência nos commodities agrícolas e de mineração na região. Empréstimos à região da América Latina e do Caribe feitos pelo Banco de Desenvolvimento da China, sozinhos, ultrapassaram em muito aqueles feitos por outras Instituições Financeiras de Desenvolvimento Internacional que operam na região – chegando a mais de 33 bilhões de dólares em 2010. De acordo com o Dialogue, entre 2005 e 2017, o Banco de Desenvolvimento da China e o Banco de Exportação e Importação da China concederam à região mais de 150 bilhões de dólares, quantia maior que a concedida pelo Banco Mundial, Banco Interamericano de Desenvolvimento e o Banco de Desenvolvimento da América Latina juntos.
O Banco de Desenvolvimento da China e o Banco de Exportação e Importação da China têm quatro fundos regionais na América Latina. Eles incluem o Fundo de Investimento e Cooperação Industrial China-LAC e o Fundo China-Brasil (ambos somam 20 bilhões de dólares), além de dois fundos conhecidos como “Programa Especial de Empréstimos para Projetos de Infraestrutura China-LAC”, lançados em 2014 e 2015, de 10 a 15 bilhões de dólares, e 10 bilhões, respectivamente.
É importante mencionar que a construção de infraestrutura feita pela China em casa, na Ásia e na América, com relação à responsabilidade e à transparência ambiental e social, é fraca.
O investimento de Instituições Financeiras de Desenvolvimento Internacional ocidentais
As Instituições Financeiras de Desenvolvimento Internacional ocidentais também tentam aumentar seu financiamento de infraestrutura. Bancos de desenvolvimento multilaterais, como o Banco Mundial – reconhecendo que não conseguirá reunir os fundos para atender a lacuna de multi-trilhões de dólares entre o fornecimento global para o financiamento de infraestrutura e a demanda global em sua totalidade – estão tentando atrair parceiros do setor privado. O objetivo, segundo o banco, é aumentar o financiamento de desenvolvimento “de bilhões para trilhões.”
Em um recente artigo de opinião, o presidente do Banco Mundial, Jim Yong Kim, afirma que “na verdade, não vamos conseguir alcançar (os Objetivos de Desenvolvimento Sustentável) a menos que trabalhamos para atrair o investimento do setor privado”.
O Banco Mundial recentemente aprovou um aumento de capital de 13 bilhões de dólares, que irá dobrar os níveis de empréstimos atuais da instituição até 2030. Além disso, um esforço feito pelos Estados Unidos para consolidar diversas agências aptas a fazer investimentos em países em desenvolvimento – chamado de BUILD Act – está tramitando rapidamente no Congresso. A lei pode criar uma nova Instituição Financeira de Desenvolvimento Internacional que colocaria o USAID Credit Authority, a Corporação para o Investimento Privado no Exterior e o Office of Private Capital and Microenterprise debaixo do mesmo teto, com mais instrumentos de capital e de financiamento à disposição da nova instituição que as demais entidades já tiveram antes.
Entretanto, mesmo que os investimentos em infraestrutura internacional aumentem, especialistas afirmam que os esforços para garantir que esse novo capital seja aplicado em projetos social e ambientalmente sustentáveis estão diminuindo. Ao escrever para o Project Syndicate, Kevin Gallagher destaca que “o atual padrão de financiamento dos bancos de desenvolvimento multilaterais, em especial do Grupo Banco Mundial, é rico em emissão de carbono”. Atualmente, o BUILD Act é desprovido de fortes modelos sociais e ambientais, tais como cláusulas sobre direitos humanos, mitigação dos gases do efeito estufa e processos de auditoria.
“Ao mesmo tempo em que o Banco Mundial tenta aumentar os investimentos privados de bilhões para trilhões, deveria também se comprometer com as garantias e responsabilidades”, argumenta Natalie Bridgeman Fields, fundadora e diretora-executiva do Conselho de Accountability e professora na Faculdade de Direito de Stanford.
Se as atividades das Instituições Financeiras de Desenvolvimento Internacional terão poucos impactos sociais e ambientais ou não, vai depender em que medida os governos que recebem os investimentos criam e fiscalizam suas próprias regras sociais e ambientais, afirma Alfonso Malky, Direcor Técnico na América Latina do Fundo Estratégico de Conservação. “A proteção fornecida pelos próprios governos será a única forma de garantir uma redução significativa dos impactos sociais e ambientais em longo prazo”, acrescenta.
No entanto, os governos dos países amazônicos, incluindo o Brasil, Peru, Bolívia, Equador, Venezuela e Colômbia têm uma reputação nada boa quanto às proteções ambientais e sociais durante o planejamento e implantação de projetos de infraestrutura de grande escala.
Projeto para ser supervisionado: o sistema de barragem Rositas, na Bolívia
Conforme mencionado antes, a maior parte dos projetos estudados pela Boston University se situa nas nascentes da região dos Andes. Como a crescente onda de financiamento internacional vai terminar para a região da bacia do Amazonas ainda é algo por vir. Um projeto já planejado que preocupa, afirma Ray, é o projeto da hidroelétrica Rositas na Bolívia. A barragem pode inundar uma área enorme, rica em biodiversidade, além de afetar mais de dez comunidades locais.
Se construída, a barragem hidroelétrica de 156 metros de altura e capacidade para 400 megawatts será alocada no Rio Grande e Rio Rositas, na bacia do Rio Grande. Planejado desde os anos 1970, o projeto só atraiu financiamento recentemente. De acordo com a base de dados da China Global Dams, o Banco de Exportação e Importação da China vai fornecer 850 milhões de dólares para o projeto, enquanto a companhia nacional de eletriciadade da Bolívia, a Empresa Nacional de Eletricidad Bolivia, vai contribuir com mais 150 milhões.
A maior parte da eletricidade gerada pela barragem Rosita deve ser destinada à exportação. O projeto é parte de um esquema maior de desenvolvimento de energia hidroelétrica, que consiste em oito mega-barragens na bacia do Rio Grande. Juntos, de acordo com as previsões governamentais, os oito projetos vão produzir cerca de 3 mil MW, quase o dobro da maior demanda nacional da Bolívia.
Entretanto, a barragem Rositas vai inundar aproximadamente 45 mil hectares de áreas de florestas, de acordo com um Entretanto, a barragem Rositas vai inundar aproximadamente 45 mil hectares de áreas de florestas, de acordo com um – o equivalente, em tamanho, a mais da metade da cidade de Nova Iorque. A perda da cobertura vegetal por conta da inundação acarretará na eliminação de uma grande área de sequestro de carbono, enquanto deixará uma vegetação rasa com risco de apodrecer, o que pode lançar uma grande quantidade de metano, um poderoso gás que contribui para o efeito estufa, na atmosfera. Análises recentes que usaram a ferramenta HydroCalculator, do Conservation Strategy Fund – um software open-source que utiliza dados fornecidos pelos usuários para fazer análises de custo-benefício das barragens hidroelétricas – estimam que a barragem e o reservatório Rositas podem emitir cerca de 70 milhões de toneladas de CO2, mais do que a emissão anual do estado da Carolina do Sul (EUA).
Além disso, comunidades indígenas locais que podem ser afetadas pela barragem alegam que elas não foram corretamente consultadas, como exige a legislação boliviana e a Convenção sobre os Povos Indígenas e Tribais da Organização Internacional do Trabalho (nº 169), a qual a Bolívia é um dos países signatários. As comunidades indígenas entraram com uma ação contra a Empresa Nacional de Eletricidad Bolivia.
“O Banco de Exportação e Importação da China pode não saber que recebeu um pedido para financiar um projeto que não recebeu apoio de nenhum outro lugar, que não apresenta benefícios, segundo uma perspectiva ambiental, e que pode provocar um sério conflito (indígena)”, afirma Rebecca Ray.
Projeto para ser supervisionado: A Rodovia Interoceânica, Brasil-Peru
Enquanto a barragem Rositas pode ser uma das barragens mais perigosas do ponto de vista ambiental na agenda da bacia amazônica, a Rodovia Interoceânica Brasil-Peru, que visa ligar o Oceano Pacífico ao Atlântico, é talvez o projeto mais debatido.
A rodovia pode atravessar entre 3.000 a 5.000 quilômetros, dependendo de qual caminho será escolhido, e oferecer um meio de transporte de commodities, mais eficiente e de menor custo, do Brasil e outros países amazônicos para a China e o resto da Ásia. Espera-se que a rodovia diminua o custo da carga de grãos que vão do Brasil para a China em torno de 30 dólares por tonelada, assim como outros produtos, como o ferro e a soja do Brasil, e o ouro e o cobre do Peru.
O projeto caminha a passos lentos desde o seu anúncio inicial, feito com algumas imprecisões pelo governo para a mídia. Em fevereiro, o vice-ministro de Relações Internacionais do Brasil, Jorge Arbache disse à Reuters que os planos da rodovia transcontinental tinham “parado porque era extremamente cara e que o estudo para sua execução era muito insatisfatório”. Ele acrescentou que “os desafios de engenharia eram absurdos”. Mas a Embaixada Chinesa no Brasil refutou a declaração logo depois, afirmando que a China, o Brasil e o Peru haviam entrado em acordo. No final de abril, a Railway Technology relatou que “as conversas tem se intensificado nos últimos meses”.
Espera-se que muitos custos ambientais e sociais acompanhem tal projeto. De acordo com Rebecca Ray, existem duas possíveis rotas sendo consideradas. “Uma cruza um território indígena sem contato com o mundo de fora, ou isolado por própria vontade, na região central da fronteira entre Peru e Brasil. A outra cruza o sul do Peru, na bacia hidrográfica Madre de Dios, uma área que já foi muito afetada pelo desmatamento ligado à mineração informal de ouro, facilitada pela rodovia CVIS, no Peru”. Um relatório do Grupo Regional de Financiamento e Infraestrutura aponta que, de cinco possíveis rotas para a rodovia, quatro atravessam áreas protegidas ou reservas indígenas.
Paulina Garzón, diretora da Iniciativa de Investimento Sustentável China-América Latina do Bank Information Center, declarou ao The Guardian que “esse projeto é emblemático e é possível que se torne o foco das organizações da sociedade civil da América Latina. Ele será muito controverso do ponto de vista ambiental e social”.
Uma estrada transcontinental que diminua os custos e a rota comercial para as commodities transportadas entre o interior rico em recursos do Brasil e do Peru, rumo à rápida expansão nos mercados asiáticos, pode escancarar a bacia amazônica para um desmatamento em massa. As florestas tropicais da região estarão destinadas a se tornarem locais de produção de carne, soja, milho, algodão, cana de açúcar e óleo de palma, assim como de mineração em larga escala de ferro, ouro, cobre e alumínio.
Os detalhes de financiamento e contratação para a rodovia ainda são incertos. Investidores e empreiteiros chineses, tchecos, franceses, alemães, espanhóis e suíços expressaram interesse, um indicador do potencial lucrativo do projeto. Em 2016, o Dialogue especulou que o apoio da China supostamente seria proveniente do Programa Especial de Empréstimo gerenciado pelo Banco Chinês de Desenvolvimento para Projetos de Infraestrutura da China e América Latina, e de uma linha de crédito pré-aprovada para o governo boliviano. Segundo a Railway Technology, os consórcios da Espanha, Suiça e Alemanha, representados por mais de 70 empresas no total, estavam envolvidos em discussões recentes.
A rodovia não só ameaça as bacias das florestas tropicais, mas também coloca a estabilidade global do clima em risco. Com cerca de 17 a 18% de toda a Amazônia já desmatada, cientistas alertam que um aumento de 20 a 25% possa resultar em uma mudança brusca nos padrões de chuva da região , rumo a uma seca generalizada e a um ponto em que grandes faixas da floresta podem se converter rapidamente em savana. A perda de grande capacidade de absorção de carbono das bacias das florestas amazônicas pode resultar em um grande aumento dos gases do efeito estufa e do aquecimento global em 2 graus Celcius o teto permitido pelo Acordo do Clima de Paris.
“Abrir a Amazônia para mais construções de rodovias e barragens e extração de recursos vai fazer com que a região ultrapasse o seu ponto crítico”, afirma Kevin Koenig. “Precisamos ter uma abordagem abrangente para proteger os ecossistemas da Amazônia, que respeite os direitos e os territórios indígenas”.
Referência:
Ray, K. P. Gallagher, and C. Sanborn, Standardizing Sustainable Development? Development Banks in the Andean Amazon. (2018) Sponsored by the John D. and Catherine T. MacArthur Foundation, Charles Stewart Mott Foundation, Rockefeller Brothers Fund. Published by the Boston University Global Development Policy Center, Center for China and Asia-Pacific Studies- Universidad del Pacífico. http://www.bu.edu/gdp/files/2018/04/Development-Banks-in-the-Andean-Amazon.pdf
Gus Greenstein é aluno de doutorado no Programa Interdisciplinar de Meio Ambiente e Recursos Emmet da Universidade de Stanford. Seu projeto atual foca na evolução das instituições de financiamento ao desenvolvimento e seus padrões socioambientais. Siga-o no Twitter @GusGreenstein.
Fonte: https://pt.mongabay.com/2018/09/185942/[/vc_column_text][/vc_column][/vc_row]